RESUMO DO LIVRO TERCEIRA SEDE
ILHA NADANDO DE COSTAS
São dez elegias, mais de dez poemas. Antes de ser um poeta, Carpinejar é um pesquisador da alma e dos apelos humanos, sintetizados e muitas vezes ampliados no território de sua vivência pessoal, na sua maneira de ver e sentir o mundo.
Sobretudo, no sentir-se. Tudo o que se exige do poema moderno, inclusive a contenção formal, a ausência de adornos e margens, já estava presente na obra anterior, tanto em As Solas do Sol como em Um Terno de Pássaros ao Sul, coletâneas que inscreveram o nome de Carpinejar entre os poetas mais expressivos da sua geração.
Uma ilha nadando de costas. As metáforas, pão e vinho da poesia, são o forte dessas elegias, que podem ser lidas como um poema só ou fragmentadas numa sucessão de haikais, cintilantes, precisos, necessários.
Terceira Sede, permito-me aqui revelar, teve um título anterior, que incluía as palavras fundamentais da arquitetura poética: memória e sede. Transcendendo o espaço físico de uma existência, as elegias aqui reunidas alcançam a intemporalidade, que é mais modesta do que a eternidade, mas tem a mesma dimensão: “Atravessei o século e ainda não me percorri. / Tornei-me o diário de uma viagem cancelada.”
Citei dois versos da primeira elegia e citarei o último verso da décima: “Envelheci, tenho muita infância pela frente.” No limiar de seus primeiros 30 anos, o poeta adquire um ponto de vista autônomo e privilegiado para se olhar e olhar a vida.
Presente, passado e futuro não formam memória, sua mesa está repleta de ausências. Coloca-se à frente do tempo, atinge uma idade que ainda não tem: “Como posso ter morrido antes, decidi antecipar a velhice.”
Tal como Dante, no meio do caminho, todo poeta busca este patamar impreciso, de onde pode contemplar, gradualmente ou simultaneamente, o inferno, o purgatório e o paraíso da condição humana. Terceira Sede é embrião e súmula da viagem que todos fazemos em busca das estrelas, “e quindi uscimmo a riveder le stelle”. Ao deixar o inferno, ilha nadando de costas, temos direito ao paraíso desde que aceitemos o purgatório: falta-nos talento para esquecer.
Pessoalmente, acredito que Carpinejar está condenado a um poema único, indestrutível, inconsútil como a túnica dos verdadeiros condenados. Sua entrega à poesia é total, urgente, inadiável. Embora confesse na terceira elegia a nostalgia do silêncio, “cedo aprendi a falar, tarde a me calar”, Terceira Sede é definitivo como um poema em si, mas inconcluso como a própria sede nunca saciada.
Carlos Heitor Cony
Autor: Fabrício Carpinejar
Editora: Bertrand Brasil
ISBN: 8528613844
Formato: 14 X 21 cm
Número de Páginas: 96
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